19.6.07

O nome dele é Brasil

Quando a torcida grita “Brasil! Brasil!”, fala do país e de André, o atleta do IBDD que leva para o pódio a bandeira e o nome do Brasil

ANDREI BASTOS

Além do nome, o jovem campeão tem do seu país a mesma alma gentil. Hoje com 23 anos, André considera que atingiu um grau de amadurecimento muito positivo para sua vida pessoal e para seu desempenho como atleta. Ele se refere com gratidão e carinho à dedicação dos seus pais, Carlos e Tânia, incansáveis durante todo o período da sua reabilitação, que precisou de sete cirurgias e uma boa temporada na ABBR, e depois, quando o levavam para nadar no Botafogo, no Mackenzie, onde se federou aos 9 anos, no Vasco e, por fim, no IBDD, depois que se reconheceu como atleta com deficiência, no final de 2004.

A descoberta

Foi seu pai que, percebendo a semelhança entre seu problema físico, uma seqüela de poliomielite, e a aparência do nadador canadense que disputava uma prova na Paraolimpíada de Atenas, em 2004, chamou a atenção para a possibilidade de uma carreira na natação paraolímpica, hoje uma realidade bem-sucedida.

Mas o sucesso hoje experimentado pelo nosso nadador não dependeu apenas das suas pernas e braços e não foi sempre “uma piscina” de tranqüilidade. Em 2005 ele sofreu um revés com sua desclassificação internacional como atleta com deficiência. O IBDD, tão consciente quanto ele da sua classificação correta, manteve o apoio durante os sete meses que durou essa situação, revertida com a reclassificação ocorrida no Mundial da África do Sul, em abril de 2006. André voltou para o Brasil reclassificado, amadurecido e campeão!

O amadurecimento

Embora sua juventude coloque o fim da vida como atleta a uma grande distância, André revela outra faceta do seu amadurecimento ao dedicar muitas “braçadas” à sua formação nas Faculdades IBMR como fisioterapeuta, profissão que pretende exercer quando abandonar as piscinas. Por enquanto, a dedicação ao esporte é prioritária, exigindo da namorada Ana Carolina o sacrifício de ficar no Rio enquanto ele treina em São Paulo. Mas como ela é sua incentivadora incondicional, a ausência e a distância só aumentam a alegria dos reencontros.

Nos Jogos Parapan-americanos deste ano, no Rio, André vai disputar todas as nove provas da sua categoria e, com toda certeza, vamos comemorar suas vitórias representando nosso país gritando muitas vezes o nome dos dois: “Brasil! Brasil!”.

O desempenho de André Brasil

2005

Circuito Loterias Caixa de Atletismo e Natação – 1ª etapa, Belo Horizonte/ BH
1º colocado nas provas: 50m (recorde mundial), 100m, 400m livres e 100m borboleta

Campeonato Brasileiro de Modalidades – Rio de Janeiro/ RJ
1º colocado nas provas: 50m, 100m, 400m livres e 100m borboleta

Circuito Loterias Caixa de Atletismo e Natação – 2ª etapa, Recife/ PE
1º colocado nas provas: 50m, 100m, 400m livres e 100m borboleta (recorde mundial)

Circuito Loterias Caixa de Atletismo e Natação – 3ª etapa, Rio de Janeiro /RJ
1º colocado nas provas: 50m, 100m (recorde mundial), 400m livres e 100m borboleta

2006

Circuito Loterias Caixa de Atletismo e Natação – 1ª etapa
Categoria S10: 1° lugar nas provas: 50m, 100m e 400m livres; e 100m borboleta

Circuito Loterias Caixa de Atletismo e Natação – 2ª etapa
Categoria S10: 1° lugar nas provas: 50m, 100m e 400m livres; e 100m borboleta

Circuito Loterias Caixa de Atletismo e Natação – 3ª etapa
Categoria S10: 1° lugar nas provas: 50m, 100m e 400m livres; e 100m borboleta

Circuito Loterias Caixa de Atletismo e Natação – 4ª etapa
Categoria S10: 1° lugar nas provas: 50m, 100m e 400m livres; e 100m borboleta

Nedbank National Summer ChampionshipsLocal: Bloemfontein, África do Sul; 1 a 7 de Abril
2006
1º lugar nos 50m, 100m e 400m livres; 50m costas e 100m borboleta na classe S10

IPC Swimming World ChampionshipsLocal: Durban, África do Sul; 01 à 09 de Dezembro
Categoria S10: 1º lugar e recorde mundial nos 50m, 100m livres e 100m borboleta; 1º lugar nos 400m livres; 3º lugar nos 200m medley e no revezamento 4 X 100

2007

Circuito Loterias Caixa de Atletismo e Natação – etapa regional centro– oeste ( convidado )Categoria S10: 1° lugar nas provas: 50m, 100m e 400m livres; e 100m borboleta

Circuito Loterias Caixa de Atletismo e Natação – etapa regional sudeste
Categoria S10: 1° lugar nas provas: 50m, 100m e 400m livres; e 100m borboleta

Circuito Loterias Caixa de Atletismo e Natação –etapa regional nordeste ( convidado )
Categoria S10: 1° lugar nas provas: 100m livres; 100m costas

Fonte: Site do IBDD (www.ibdd.org.br)

Palpite infeliz

ALEXANDRE GASCHI

Nos últimos anos, em razão de uma idéia de um senador da República, discutiu-se, em âmbito nacional, a criação do Estatuto da Pessoa com Deficiência. Como medida, causou grande impacto no segmento de pessoas com deficiência, que iniciaram acirrado debate sobre sua real necessidade.

Na realidade, desde os anos 1970, quando surgiram as primeiras leis, a exemplo da Emenda Constitucional 12, de 1978, a situação do segmento praticamente não se alterou, mesmo com o advento da carta magna de 1988, e com a publicação de vasta e excelente legislação infra-constitucional que assegura a inclusão social das pessoas com deficiência.

O problema continua sendo a ineficácia das normas e a inexistência de políticas públicas, como marco histórico de uma cultura viciada do país, em que seus representantes normalmente subordinam os interesses públicos aos seus próprios interesses, alijando as pessoas com deficiência de quaisquer oportunidades de terem sua inclusão social respeitada.

Este é exatamente o caso do tão comentado estatuto!

Após leitura do estatuto, depreendemos que fez-se apenas, e mal, cópia da legislação existente, sem que questões relevantes fossem disciplinadas. Exemplo disso é seu capítulo destinado aos transportes coletivos, que determina a elaboração de um regulamento sem a fixação de quaisquer prazos. Ora, o Decreto nº 5.296 que regulamentou a Lei de Acessibilidade nº 10.098, apesar de estabelecer prazos longos, disciplina a matéria sem a necessidade de qualquer outra norma que venha a estabelecer prazos novos e/ou mais extensos ou ainda suscitar interpretações que prejudiquem seu cumprimento.

Deve-se ter em mente que estatuto nada mais é do que uma lei ordinária auto-aplicável, dirigida à tutela, defesa e promoção dos direitos mais básicos de pessoas que fazem parte de uma camada excluída ou vulnerável da sociedade, sendo um diploma legal que disciplina uma proteção dos que necessitam, por ausência ou lacuna da legislação existente, ser protegidos por um diploma abrangente que trate da sua condição de fragilidade.

Não é nosso caso, o que precisamos é de eficácia legislativa para termos nossos direitos fundamentais assegurados.

No caso do citado estatuto, além de não ser o diploma adequado ao segmento, seus criadores fizeram um “recorta e cola”, onde partes de diversas leis e regulamentos existentes foram juntadas em uma ordem de assuntos e, pasmem, aprovada pelo Senado e em trâmite na Câmara, nesta casa liderado por deputado federal que, a exemplo do senador, parece que visa sua futura reeleição, situação comum para profissionais de uma política partidária arcaica.

As pessoas com deficiência economicamente ativas, como qualquer outro cidadão, querem somente a igualdade de oportunidades em todas as áreas, sendo certo que aquelas que dependem de uma proteção legal já estão protegidas pelos diversos diplomas existentes, sem exceção.

A legislação em vigor se presta exatamente a esse fim, partindo-se das normas gerais e diretrizes determinadas pela lei 7.853/89. Se não vemos avanços significativos até o momento, tal situação se deve à cultura do país no descumprimento das normas e não à falta delas.

O advento do estatuto não alteraria este quadro, muito pelo contrário, e somente prejudicaria a interpretação do que já existe com a norma posterior, dificultando sobremaneira a realização de ações e a diminuição do número, já ínfimo, de conquistas do segmento.

Na verdade, o que se constata é mais um movimento político visando a perpetuação no poder dos envolvidos na elaboração do estatuto. Se aprovado este diploma infeliz, tais profissionais de uma política – esta sim deficiente - serão marcados e reeleitos por serem os políticos que fizeram o Estatuto da Pessoa com Deficiência, que em nada suprirá a falta de cidadania vivenciada há décadas pelo segmento.

Apesar de toda a badalação em torno do famigerado diploma, lutemos para que ele seja derrubado e conquistemos alterações significativas na legislação existente para melhorarmos as condições de cidadania do segmento para, num futuro próximo, termos do que nos orgulharmos como resultados de nossas próprias escolhas.

Fonte: Site do IBDD (www.ibdd.org.br)

15.6.07

Heroísmo sem limites
















Luiz Cláudio Pereira, Luís Cláudio Pontes e Alexandre Gaschi quando verificaram a acessibilidade no Maracanã, palco da abertura dos Jogos Parapan-americanos de 2007

O IBDD (www.ibdd.org.br) vai publicar um livro em homenagem aos seus atletas durante os Jogos Parapan-americanos. Os autores são João Máximo (texto), Rogério Reis (fotos) e Victor Burton (design gráfico).

Heroísmo sem limites

CATARINA D’AMARAL

Heroísmo sem limites é o título de um livro que o Instituto Brasileiro dos Direitos da Pessoa com Deficiência vai publicar durante os Jogos Parapan-americanos. Esta proposta não é fortuita, não é casual. Ela tem mais que um objetivo. Tem um sentido. É uma construção.

O Rio de Janeiro vive em 2007 um momento espetacular no mundo do esporte. Entre 13 e 29 de julho acontecem, por toda a cidade, os Jogos Pan-americanos. Cerca de 5.500 atletas de 42 países da América do Norte à América do Sul participarão das 33 modalidades desportivas que fazem parte do Pan. O mundo todo conhece essa competição, todo o Brasil está seguindo as notícias sobre a preparação do Rio de Janeiro para os jogos, e espera ansioso pelo seu início. Mas nem todo o país sabe que, terminado o Pan, tem início o Parapan-americano, a competição paradesportiva oficial das Américas. Pela primeira vez as competições pan-americanas desportivas e paradesportivas serão realizadas na mesma cidade, uma na seqüência da outra. Os estádios, as concentrações, os alojamentos, a infra-estrutura criada para o Pan servirão também ao Parapan. A publicidade em torno aos dois eventos, no entanto, não será a mesma.

É pena.

Se o esporte é o lugar por excelência da superação de limites, os atletas com deficiência já começam a competição como campeões. Se o esporte emociona e contribui para a grandeza do homem, o paradesporto exalta o heroísmo sem limites dos atletas com deficiência; ele enobrece a alma. As exigências diárias na vida de uma pessoa com deficiência no Brasil fazem dela uma lutadora, e as competições esportivas internacionais dão a chance ao mundo de conhecê-la.

O IBDD participa e quer participar ainda mais da divulgação do paradesporto. Para a pessoa com deficiência, o esporte rompe várias barreiras: é uma forma de reabilitação física e psicológica que, além de ajudar a vencer o preconceito, mostra à sociedade que sua vida pode ser ativa, competitiva e autônoma. Por isso, o IBDD pensa diferente. Para o Instituto, o Rio de Janeiro vive em 2007 este momento espetacular: entre os dias 12 e 19 de agosto a cidade irá sediar os Jogos Parapan-americanos. 1.300 atletas com deficiência disputarão 10 modalidades: atletismo, basquetebol em cadeira de rodas, natação, halterofilismo, futebol de 5, futebol de 7, judô, tênis de mesa, tênis em cadeira de rodas e voleibol sentado. O Brasil participará de todas elas. O IBDD, como clube paradesportivo, tem 14 atletas pré-convocados para competirem na natação, no judô e no futebol de 7 (para paralisados cerebrais). No judô, deverão participar Antonio Tenório, tricampeão paraolímpico, que recebeu em dezembro de 2006 o troféu de melhor atleta paraolímpico masculino do ano no Prêmio Brasil Olímpico, concedido pelo Comitê Olímpico Brasileiro – COB; Eduardo Paes, medalha de Prata nas Paraolimpíadas de Atenas; Elmo Mamede Carvalho Vaz, campeão brasileiro em 2005 na categoria meio-pesado, campeão brasileiro de boxe até sofrer um acidente durante um treino preparatório para a luta em que deveria disputar o título mundial contra Evander Hollyfield e perder a visão em um olho, e, progressivamente, no outro; Lourdes Maria Silva de Souza, bicampeã brasileira, medalha de ouro no mundial de 2005 e de bronze em 2006; Roberto Paixão, campeão da Copa Brasil 2006, e Renata Quintão. A seleção brasileira de futebol de 7 poderá contar com Adriano Biggi, integrante da seleção nas Paraolímpiadas de Atlanta, Sidnei e Atenas; José Carlos Monteiro Guimarães, o Zeca, artilheiro do time de futebol do IBDD e da seleção brasileira paraolímpica; Thiago Carneiro, eleito o jogador revelação do campeonato brasileiro em Campo Grande/MS, integrando a equipe do IBDD; Pedro Santos Jr. e Antonio Marcos Passos da Rocha, todos os cinco membros do time de futebol de 7 do IBDD. Na natação, estão pré-convocados José Afonso Medeiros, o Caco, campeão paraolímpico em Atlanta nos 50m borboleta, campeão mundial no Torneio de Natação realizado na ilha de Malta, em 1994 (competição em que bateu o recorde mundial, superado apenas seis anos depois), três vezes medalha de ouro e uma vez de prata no Parapan-americano de Mar del Plata em 2003; e André Brasil, que conquistou quatro medalhas de ouro no Mundial de Natação Paraolímpica 2006, realizado em Durban, na África do Sul, nas provas de 50m, 100m e 400m livres, e 100m borboleta, batendo o recorde mundial nas provas de 50m e 100m livres e nos 100m borboleta. Além das medalhas de ouro, André também conquistou a medalha de bronze nos 200m medley e no revezamento de 4x100m.

É pelo seu envolvimento direto com o paradesporto, é por conhecer as dificuldades e as conquistas que os atletas com deficiência experimentam nas suas vidas que o IBDD acredita que o Parapan-americano merece todo o destaque e a atenção da mídia, e através dela, de todo o Brasil. O IBDD pretende contribuir produzindo um livro em homenagem aos seus atletas. Uma publicação centrada nas belas imagens que nascem do trabalho – do treino às competições e às vitórias – de todos os atletas do IBDD, cujo núcleo paradesportivo inclui, além dos esportes de competição que participarão do Parapan, bocha e dança.

O Rio de Janeiro está se organizando para sediar o Pan, mas também está se preparando para receber os atletas parapan-americanos. O maior estádio de futebol do mundo, o Maracanã, foi inteiramente adaptado para se tornar acessível às pessoas com deficiência. Os que jogam e os que assistem. A Vila Pan-americana foi projetada para receber os atletas com deficiência. Essas obras sobreviverão ao Pan e poderão ser parte do processo de inclusão das pessoas com deficiência na cidade, na sociedade e no mundo do trabalho. Esse processo é longo e árduo, o IBDD sabe disso. A sua proposta é aproveitar, por meio da publicação de um livro de alto apelo visual, a oportunidade aberta pelo Parapan de dar visibilidade ao paradesporto e contribuir para as mudanças tão necessárias à construção da cidadania das pessoas com deficiência no Brasil.

13.6.07

O Haiti é aqui?

A propósito da discussão que está acontecendo por agora, sobre o possível papel de polícia das Forças Armadas, republico abaixo um texto que escrevi em 09/03/2006, quando o Exército ocupou a cidade atrás de armas que lhe foram roubadas (acredito que ele contém algumas reflexões e preocupações ainda válidas).

O Haiti é aqui?

ANDREI BASTOS

Os episódios recentes dos suicídios de dois generais, da guerra da Rocinha e do roubo das armas de um quartel, com a conseqüente ocupação do Rio de Janeiro pelo Exército, não estão relacionados como numa conspiração de dentro pra fora ou como resultantes de uma ação de desestabilização. São fatos isolados, mas são conseqüências, aí sim, de uma conspiração de fora pra dentro, e a relação que existe entre eles é de refletirem a degeneração das instituições brasileiras. Muito longe de ser um militarista, eu concordo com o texto "O Estado e a ordem", publicado no Jornal do Brasil de 06/03/2006, quando lembra que “o governo Fernando Henrique pretendia transformá-las (as Forças Armadas) em meras forças policiais, destinadas a atender aos interesses geopolíticos americanos, sob o pretexto do combate às drogas em nosso continente. Clinton - e o próprio ex-presidente Fernando Henrique confessou isso recentemente - queria envolvê-las no conflito interno colombiano” e, mais adiante, quando diz que “talvez com o objetivo de enfraquecê-las ainda mais, o governo passado mandou reduzir o recrutamento, diminuindo consideravelmente os seus efetivos e a preparação de reservistas”.

Qualquer país que assim mereça ser chamado precisa de Forças Armadas capazes de atuar com eficiência em questões da verdadeira segurança nacional, não permitindo, no nosso caso, que viremos quintal dos EUA, que o tráfico domine a Amazônia etc. etc., da mesma forma que também precisa de polícias com igual eficiência para combater o crime organizado.

Segurança nacional e segurança pública hoje estão inter-relacionadas porque igualmente deterioradas, como resultado de um esforço deliberado para tal, o que também informa o texto citado acima: “Os neoliberais resolveram acabar com o Estado, e, sem Estado, ninguém consegue impor, em nome da sociedade, a autoridade da lei”. Não será porque não podemos enfrentar em pé de igualdade as armas poderosas dos nossos irmãos do Norte, ou seja lá de onde forem, que renunciaremos à soberania. Mesmo porque soberania não é uma questão apenas de poderio militar e Educação, Saúde, Ciência e Tecnologia estão igualmente deterioradas no Brasil. Ainda recorrendo ao texto do JB, “se, a prazo maior, temos que reconstruir o Estado e retomar o desenvolvimento econômico e social, a situação nos exige medidas de emergência para a recuperação das nossas Forças Armadas”.

No campo da segurança pública basta lembrar o recente episódio da guerra da Rocinha para constatarmos inclusive a comprometedora ausência das forças policiais, que abandonaram a comunidade à própria sorte.

Não existe qualquer golpe em marcha. Estamos vivendo é um momento de esculhambação total, com a falência das instituições, e precisamos agir para que o Brasil não se transforme num Haiti gigante, tendo o Rio como sua capital da baderna. O Exército está correndo atrás da dignidade perdida nas favelas cariocas e age desajeitadamente, fora de sintonia com a realidade e a tecnologia, sem jogo de cintura, sem malícia. Está no meio da maior malandragem do planeta, aí incluídos os políticos que venderam a alma a quem melhor lhes pagou, e age desajeitadamente quando adota procedimentos de guerra convencional, com cerco, revista de populares e posicionamento de blindados com canhões apontados para as casas das pessoas. Esta ação de busca das armas e prisão dos soldados suspeitos deveria ser tarefa para comandos especializados, agindo sem estardalhaço, sem aparecer nas primeiras páginas dos jornais sendo ridicularizados pelos traficantes como vimos.

O Exército está fora de sintonia com a realidade porque não percebeu que esta guerra, que pensa estar travando hoje nas favelas cariocas, já está dentro da caserna há muito tempo e a maior demonstração disso é a evidência de que o assalto contou com a participação de ex-militares da própria guarnição. Está fora de sintonia na tecnologia porque não dispõe (ou não usa) armas adequadas para o tipo de ação necessária no caso, coisa em que os traficantes estão em vantagem. Não tem jogo de cintura porque, com todos estes equívocos e ainda mobilizando mais homens do que o efetivo que está no Haiti, se expõe a um vexame maior do que já foi o fato de ter sido roubado em uma unidade militar. Não tem malícia porque acredita que a população favelada vai acatar a solicitação de denúncias, o que revela inocência em relação ao código de terror que rege a vida dessas comunidades e ao papel que o tráfico também tem nelas como empregador, viabilizador de ascensão social e patrocinador de benefícios sociais. Por isso, é provável que seja passado pra trás pela malandragem, que não faz os negócios mais lucrativos nos morros e sim no asfalto, nas classes A e B da Zona Sul, onde encontramos muitos dos políticos que venderam a alma para quem melhor lhes pagou, não sendo apenas os que estão envolvidos com o tráfico, pois eles existem, mas todos os que contribuíram com ação ou omissão para o estado de degenerescência em que se encontra nossa sociedade.

Está difícil enxergar alguma coisa boa nesta ação, que passa mais a idéia de amor-próprio ferido do que de defesa das instituições sociais, todas elas, e não só a das Forças Armadas. Talvez o único aspecto positivo seja a tênue sinalização de que a sociedade ainda tem a quem recorrer, além da(s) Igreja(s), mas isto precisa ser ratificado com o sucesso da operação. Já que o Exército botou o bloco na rua, só pode sair dela como herói, de preferência não bolivariano, resgatando a auto-estima dele e a nossa.

Os índices de violência só caíram, temporariamente, por causa da presença das tropas nas ruas. Assim que os soldados saírem da paisagem, fica tudo como dantes no quartel de Abrantes, não tendo ocorrido efetiva redução da violência. Não é porque o Exército é "menos" corrompido que a criminalidade recuou, e nem é porque sua presença provoca medo. A bandidagem, aí incluídos policiais corruptos etc., tem medo é de que esta ação se desdobre num processo em que a sociedade se mobilize contra ela, o que seria um belo resultado, pois é disso que estamos precisando, mais do que de tanques. Regidos pelas nossas consciências, não podemos mais tolerar a grande irresponsabilidade que existe em toda a escala social. É pouco o que podemos fazer, mas precisamos começar.

Eles não sabem o que fazem

O Globo, Opinião, 02/06/2006:

Eles não sabem o que fazem

ANDREI BASTOS

Se a boa-fé levou as pessoas, inclusive os políticos envolvidos, a formular um Estatuto da Pessoa com Deficiência, devem ser perdoadas porque não sabem o que fazem. Não é possível que conheçam a história de quem se viu rejeitado e ignorado e, sem mágoa ou rancor, construiu ou reconstruiu a si mesmo a partir de uma condição desfavorável, muitas vezes absolutamente. Foi esta a principal conquista das pessoas com deficiência.

É preciso perdoar as pessoas de boa-fé porque a rejeição e ignorância manifestadas por elas não são frutos de convicções filosóficas ou políticas, e sim expressões culturais milenares, herdadas por elas e por nós. Um pecado original.

Sou um neodeficiente físico (2003) e, infelizmente, só tomei conhecimento da proposta do estatuto, como de muitas outras coisas, por agora. Não importa que ele esteja em discussão há muitos anos e que ninguém tenha questionado sua conveniência. Eu o faço hoje.

Evidentemente, já que este problema chamado estatuto foi colocado, quem estiver verdadeiramente interessado na defesa dos direitos das pessoas com deficiência precisará trabalhar dobrado, em duas frentes, para não ver tais direitos prejudicados. Será um trabalho aparentemente contraditório, pois ao mesmo tempo em que deverão ser propostas correções no estatuto, para se evitar o desastre, o combate à sua consecução deverá ser implacável.

O combate deverá ser implacável porque o status de tuteladas que o simples nome "estatuto" confere às pessoas com deficiência é uma indignidade, e não podemos admitir que as conquistas obtidas, especialmente a superação da baixa auto-estima, sejam ignoradas e sejamos tutelados e classificados como cidadãs e cidadãos de segunda classe. Digo isso sem desmerecer as crianças, adolescentes e idosos, que são pessoas indefesas, pela idade ou condição física, precisando ser protegidas por estatutos.

Nós, pessoas com deficiência, temos que nos proteger é dos que procuram se aproveitar de uma fragilidade conceitual ainda existente no segmento e nos empurram conceitos equivocados de caridade e piedade.

Se o senador Arns e os outros políticos que tomaram alguma iniciativa no sentido de resguardar nossos direitos com um estatuto agiram de boa-fé, é preciso avisá-los de que a legislação existente já cumpre este papel, colocando-nos em igualdade de condições com os demais cidadãos, e que os sentimentos de dó e compaixão que compõem sua boa-fé são, na verdade, manifestações de um pecado original. É preciso dizer para eles se levantarem e virem para o nosso meio, e não o contrário, porque não podemos excluir nossos companheiros cadeirantes, impossibilitados de se levantar, e nossa causa é ecumênica.

Mas se por trás dessas ações o que existe é oportunismo político ou a busca de atendimento a necessidades específicas, como a dos excepcionais atendidos pelas APAEs, por melhor que seja este fim, devemos rechaçar os oportunistas e a tutela do Estatuto da Pessoa com Deficiência que querem nos impingir e, então, justificadamente, propor um Estatuto do Excepcional, este sim um cidadão indefeso e desprotegido.

Além disso, o respeito às leis não virá com a simples substituição das que temos, qualquer que seja o novo instrumento legal, e só ocorrerá se existirem punições rigorosas e vontade política para aplicá-las. É isso que falta. Ao começar tudo de novo, e com as falhas constatadas, este estatuto do coitadinho certamente será tão descumprido, ou mais, do que as leis em vigor.

Finalmente, se, como alguns acreditam, um estatuto reúne “todas as necessidades e direitos de um segmento, para que possa ser respeitado em sua dignidade, tenha garantida a chance de protagonismo na sociedade e respaldo no exercício de sua cidadania”, vai ser preciso revogar a Constituição e fazer estatutos para negros, mulheres, gays etc.

O Estatuto da Pessoa com Deficiência é a Constituição. Este estatuto agora proposto, motivado pela maldade do oportunismo político ou sentimentos de dó e compaixão da boa-fé equivocada, tem um pecado original.

ANDREI BASTOS é jornalista.

8.6.07

Até tu, Brutus!

O Globo, Ancelmo Gois, 08/06/2007:

Até tu, Brutus!

Alexandre Gaschi, advogado cadeirante, teve de ser carregado, segunda no Rio, ao entrar no prédio da Justiça Federal, onde impetrou ação civil pública pela lei que obriga prédios públicos a dar acesso a deficientes.

4.6.07

Manifestação na Cinelândia

















Os manifestantes, no momento em que chegavam ao prédio da Justiça Federal para dar entrada na Ação Civil Pública. Alexandre Gaschi, advogado do IBDD e usuário de cadeira de rodas, teve de ser carregado para dar entrada na Ação, pois o setor de distribuição dos processos não é acessível.

Site do RJTV, 04/06/2007:

Manifestação na Cinelândia

Portadores de deficiência física fizeram uma manifestação na Cinelândia. O protesto foi contra o descumprimento da lei federal que obriga prédios públicos a instalar rampas ou equipamentos que facilitem o acesso. O prazo para a adaptação terminou no domingo.
Os manifestantes também entraram com uma ação civil pública contra a União, o estado e o município exigindo que a lei seja cumprida.
O governo do estado informou que vai cumprir a lei, mas alega que precisa de mais tempo para fazer as reformas. Segundo a prefeitura do Rio de Janeiro, todas as obras municipais desde 2001 respeitam os critérios de acessibilidade.
A Advocacia Geral da União não se pronunciou sobre o descumprimento da lei em prédios federais e disse que só vai se manifestar sobre a ação civil pública depois de notificada pela Justiça.

1.6.07

Pelo respeito à Lei

Na segunda-feira, dia 4 de junho, o IBDD dará entrada em Ação Civil Pública na Justiça Federal, à Av. Rio Branco 243, contra a União, o Estado e o Município do Rio de Janeiro, pelo cumprimento da acessibilidade nos edifícios de uso público determinada pelo Decreto 5.296/2004, cujo prazo para implementação expira no dia 3.

O IBDD convoca os cidadãos, com ou sem deficiência, a comparecerem à manifestação pelo respeito aos direitos das pessoas com deficiência que precederá a entrada da ação judicial e acontecerá na Cinelândia, em frente ao prédio da Justiça Federal, às 14h de segunda-feira.